A filosofia dos gregos nunca deixou de ser vivida na experiência das práticas, e nunca foi um mero jogo de palavras abstratas, pronunciadas por observadores distantes. Nada menos grego do que elucubrações aracnídeas de anacoretas, dizia Nietzsche. Para os gregos filósofos, idéias e princípios se demonstram com palavras, mas também com atos, sentimentos, sofrimentos, experiências, e não visam apenas a uma desprendida especulação, mas comprometem em cheio a totalidade de uma existência. Assim, a filosofia dos gregos nunca foi uma especulação transcendente, meramente argumentativa ou dialética, mas efetivamente realizou-se em atitudes e práticas. Bastava que um ato se fizesse em desacordo com as palavras e os princípios, para que o discurso de um homem fosse completamente desacreditado, e este sequer aspirasse a ser tomado como verdadeiro filósofo. Mais do que isso, muitos dos filósofos que participaram intensamente das discussões sobre os prazeres, são lembrados e registrados na história tanto, e às vezes mais, por seus atos do que por seus escritos. É o caso de Sócrates e de muitos filósofos de linhagem socrática, como Aristipo, Antístenes e Diógenes.
A discussão dos filósofos sobre os prazeres é, portanto, uma discussão muito vívida, quer dizer, vivida intensamente e experimentada em todas as suas conseqüências práticas. Disto resulta ser uma discussão sempre repleta de exemplos reais, ou pelo menos, fartamente relatados pelas fontes históricas. Os exemplos tinham tamanha significância para certas fontes, que podemos até suspeitar de que foram forjados para tornar a vida do filósofo a sua mais perfeita lição. As anedotas encontradas na obra doxográfica de Diógenes Laércio são sempre objeto de suspeição por parte da historiografia moderna e contemporânea, mas sem elas não teríamos uma parte significativa das posturas gregas frente aos prazeres. De modo que, para nós, que queremos entrar na convivência destas posturas, pouco importa que sejam relatos de fatos realmente acontecidos ou relatos imaginados para melhor ilustrar as idéias. Que a idéia ganhe a imagem da vida, já nos é suficiente.
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